No fim de semana de Dia dos Pais, Carmo Dalla Vecchia fala a respeito da paternidade, da família e revela por que ocupou seu lugar de fala como LGBT+

Cassiano Cavalheiro

No fim de semana de Dia dos Pais, Carmo Dalla Vecchia fala a respeito da paternidade, da família e revela por que ocupou seu lugar de fala como LGBT+

O Carmo Dalla Vecchia pai nasce em 2019, quando, no dia do aniversário dele, 21 de agosto, o gaúcho ganha um baita presente: o nascimento do filho Pedro. No próximo domingo (14), ele vai celebrar 52 anos, e Pedro completa 3 aninhos. Para preparar a versão pai, o artista se preparou e está sempre aprendendo:

– Antes de o Pedro nascer, fui correndo contratar uma enfermeira para me ensinar o básico. O pai Carmo é muito ligado com detalhes, alimentação, horas de sono, psicologia infantil. Várias educadoras parentais me ajudaram através do Instagram. Hoje, só não tem informação quem não se interessa por ela. Sou um pai sem culpas. Me divido bem entre trabalho em casa.

Parte da rotina dos dois é dividida com os mais de meio milhão de seguidores de Carmo no Instagram. Em vídeos e fotos, o público e artistas famosos, como Angélica, Letícia Spiller e até a Rainha dos Baixinhos, Xuxa, se derretem ao ver o pequeno Pedro conversando com o pai, cantando músicas inteiras, e se alimentando (muito bem) em almoços e cafés da manhã. Sempre sob o olhar carinhoso e zeloso do paizão.

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– Ele odeia ser fotografado, deve ter aprendido isso com o outro pai (João, que não gosta de aparecer). Tudo que capto dele é sorte mesmo. Às vezes, quando é um vídeo, ele gosta de ver. Tem uma relação saudável com câmeras, sem exageros. Sou um pai nada radical. Procuro equilibrar tudo, telas, consumo de doces, horas de sono. Filho sem neura, mas procuro estudar sempre muito bem o que se passa com ele e o que os educadores me fornecem de material. Quando alguém chega para dar pitacos bobos, do tipo: “tem que deixar chorar” ou “colo demais estraga”, faço cara de paisagem e deixo a pessoa falar, fingindo prestar atenção. Não compro briga – explica.

Em um dos vídeos em que Pedro aparece, Carmo se declara: “Sou muito mais forte do seu lado. Dia desses, você se atravessou na cama e, durante o sono, seu pé fincou na minha costela. E eu só pensava na alegria de ter você na minha vida, filho. Te amo”.

Além das declarações de amor e da emoção, algumas situações geram boas risadas, como Carmo cantando, e Pedro pedindo para ele parar. Pedro escolhendo frutas e tomando iogurte sozinho. Questionado sobre uma situação engraçada e surpreendente com Pedro, Carmo recorda:

– Quando ele falou, com 2 anos, “Papai senta aqui, vamos conversar”, para tentar fugir do banho. Eu dei muita risada – diverte-se.

Desafios

Junto a grandes poderes (ou grandes sentimentos) vêm grandes responsabilidades, já diria Stan Lee ao escrever Homem-Aranha. Quando questionado sobre a responsabilidade de ser pai e preparar o filho para um mundo cheio de preconceito, Carmo reflete:

– Essa não é a experiência que estou tendo ao lado do meu filho, pelo menos até hoje.  E quando algum parente chega e diz: “tadinho, o que vai ser dele no Dia das Mães?”, eu facilmente consigo decifrar que isso é muito mais ignorância e preconceito de quem está falando do que uma ameaça real. Nasci com o gene da felicidade no meu DNA. Da forma que me conecto com meu filho, se algum dia ele cruzar com esse tipo de gente na rua, pode estar certo de que vai passar batido ou vai desviar.

Sobre ambição para o futuro ou um possível caminho para se trilhar até lá, Carmo explica que sua ambição é que tanto ele quanto as pessoas possam se informar mais.

– Ler mais, abrir nossos corações, nossa criatividade e que, cada vez mais, percebamos quando nossa felicidade não está “on”. Se a nossa felicidade estiver em “off” é sinal de que é hora de mudar o nosso proceder. É hora de deixarmos de ser tacanhos e pararmos de negociar com nossas ideias bobas e moralistas de conduta pessoal e alheia. Principalmente alheia. Vamos deixar as gays em paz, por favor? Vamos cuidar das nossas próprias vidas?

Lugar de Fala

Na última vez que Carmo figurou na capa da Revista MIX, ele havia falado da privacidade e de não dividir a vida pessoal na mídia. Isso também mudou no último ano quando ele optou por ocupar seu lugar de fala na causa LGBT+. A motivação? Segurança e representatividade.

– Já fazia algum tempo que eu tinha vontade de falar publicamente sobre o tema. Alguns anos de psicanálise foram fundamentais para eu descobrir o preconceito que habita dentro de mim. Sim, mesmo sendo gay, cresci em um mundo em que, culturalmente, afirmaram que eu estava errado. Em algum lugar, durante toda a minha existência, essa violência ainda vai habitar. Foi a única maneira de eu tentar, minimamente, consertar esse estrago. Eu precisei falar para ocupar um lugar de pertencimento e, ao mesmo tempo, tive uma atitude humanista de dar visibilidade a vários outros homens que, assim como eu, também são gays. Mas que, infelizmente, não têm a sorte que eu tenho de ser bem casado, num casamento estável de 17 anos, ter uma profissão que dá muito prazer, amigos, filho, enfim. Sou um homem feliz com a minha história e com as escolhas que eu mesmo fiz na vida. Ninguém me pressionou. Falei porque quis, na hora que eu quis falar. Fiz isso por mim e para que outros tenham representatividade.

Depois de dividir a vida real com o público e de se despir dos preconceitos e limitações de falas, Carmo tenta avaliar as mudanças práticas no dia a dia:

– Eu transformei o meu algoz. Eu transformei a mim mesmo. Eu transformei aquilo que poderia ter me massacrado – e que massacra muitos – em uma fonte de infinitas felicidades e possibilidades de levar informação a outros. O que mudou é que minha cabeça está em pé e tenho muito orgulho de quem eu sou hoje com todos os meus acertos, erros, e com tudo que eu tenho ainda a aprender. Mas acreditar que estou errado por gostar de rapazes? Essa lorota não me pega mais. Mentiram pra mim e eu fui muito bobo de ter aceitado essa mentira por tanto tempo.

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Figuras representativas

Se as gerações anteriores não tinham exemplos de pessoas LGBT+ ocupando espaço de destaque na sociedade, hoje, isso já não é questão. Temos LGBTs+ com destaque na política, no empreendedorismo, nas artes como música, teatro, cinema, TV, e em todas as áreas. Carmo é ciente da importância da representatividade e do exemplo que ele é desde que assumiu esse papel e recorda que, quando ele era criança ou jovem, não tinha esses exemplos que temos hoje.

– Não os tive. Estava sozinho. Um gaúcho gay solitário e bem corajoso. As pessoas que mais me incentivaram foram minha mãe, minha irmã, meus amigos, minhas primas, meus colegas de escola. Fiz uma live com meus colegas do Colégio Centenário e contei o que iria fazer e eles foram especiais comigo, assim como meu ex-marido e outras pessoas. Se houve alguma referência, foi o amor deles. E a maior de todas foi do meu melhor amigo de infância, Antônio Vicente. Cerca de um ano antes de eu falar publicamente, ele me ligou para dizer que tinha muito orgulho de mim e se tivesse a chance de ter outra vida sendo meu melhor amigo, novamente ele teria muita alegria de vivê-la. Infelizmente, ele faleceu de Covid-19 um mês antes de eu falar. A vacina ainda não havia chegado. Minha decisão veio na cerimônia de 7º dia de falecimento dele. Ele foi boa parte da minha coragem de falar. Obrigado, Antônio.

Voz que ecoa

Nos últimos meses, Carmo tem usado sua visibilidade para produzir conteúdo e divulgar vídeos em que pergunta a profissionais, pessoas do convívio e a colegas de trabalho qual a diferença entre conviver com um homem heterossexual e com um homem gay? Além dessa ideia, que pega alguns de surpresa e gera respostas ótimas e simples, ele também tem produzido conteúdo informativo sobre dados do país a respeito de violência contra pessoas LGBT+, saúde pública, entre outras informações. Ele está feliz com a repercussão das publicações e promete mais.

– Estou feliz. Meu próprio preconceito baixou a guarda. A Bruna Lombardi está certa quando diz que pessoas felizes não se deixam dominar facilmente. Pessoas felizes podem ser um perigo para os moralistas de plantão. Aliás, a felicidade, assim como a empatia, tem um poder enorme de tornar o ser humano muito melhor. Mas para isso ser possível, é importante o mundo se informar e aceitar que, nem sempre, o nosso ponto de vista é o melhor. Mudar dá trabalho. Nem todo mundo se dispõe a isso. O objetivo, pelo menos para mim, é a identificação, levar as pessoas a questionarem suas ideias, me colocar num lugar de troca e de aprendizado, enfim, tentar ser melhor e fazer melhor. Não me arrependo de nada do que ocorreu no último ano e, agora, está chegando o melhor da partida. Nunca vou parar. Vou continuar falando e produzindo muito.

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Homofobia é crime

Em meio a um mar de amor e de carinho recebido no último ano, gotas de ódio. Recentemente, Carmo passou por um ataque virtual de homofobia pelo fato de ele ser gay e pai. De forma sensata, o artista respondeu em seu perfil no Instagram e, também,  tomou medidas judiciais contra essas pessoas.

– Tenho muita calma, gosto de interagir e conversar virtualmente com pessoas que conheci há cinco minutos. Gosto de gente, do ser humano. Entendo que somos diversos e não acho que todo mundo tem que pensar ou ser igual. Mas que fique claro: não precisa aceitar, mas precisa respeitar. O mundo não precisa aceitar os LGBTQIAPN+, pois não precisamos que nos aceitem. Isso depende do quanto você está disposto a se comunicar e aceitar a interferência do mundo em você. Aceitar que o planeta pode ser mais rico com a diversidade. E quanto ao ataque homofóbico, o que aconteceu foi que, em meio a 7.327 mil comentários bonitos em um único post, existiram dois que foram ofensivos. Esses dois foram devidamente denunciados à polícia e as identidades dos autores investigadas. Como é o nome disso mesmo? Gota no oceano, né? Eles devem pagar algumas cestas básicas, porque no Brasil ainda não existe uma lei adequada que nos proteja. Por enquanto, não existe. Minha primeira reação foi de querer dar um exemplo de cidadania e civismo a outras pessoas. Ninguém está totalmente protegido atrás de uma máquina. As pessoas se enganam se acreditam nisso.

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